Alfonso Cuarón e seu cinema sem fronteiras
Por Anthony M. D. Muniz
"A única razão pela qual você faz um filme não é para fazer ou se preparar para fazer um filme bom ou ruim, é apenas para ver o que você aprende para o próximo". Alfonso Cuarón
Poucos diretores ainda em atividade tiveram uma filmografia de tanto sucesso quanto a de Alfonso Cuarón. Narrando histórias que vão desde experiências mundanas (como uma viagem de carro pelo México) até jornadas de tirar o fôlego ambientadas no espaço, o diretor desenvolveu uma coletânea de filmes que marcam a experiência de quem assiste, tornando-o uma das mais importantes vozes de sua geração. Com uma trajetória marcada por inovação e excelência cinematográfica, Alfonso Cuarón se destaca como um dos diretores e roteiristas mais talentosos e aclamados do cinema contemporâneo. De sua infância no México à consagração internacional, sua jornada é um testemunho do poder da visão criativa e da paixão pelo cinema.
Nascido em 28 de novembro de 1961, na cidade do México, Alfonso Cuarón Orozco demonstrou desde cedo um interesse apaixonado pelo cinema. Ainda jovem, aos 12 anos de idade, já brincava com sua câmara e, mais tarde, iniciou sua jornada de estudos no Centro Universitário de Estudos Cinematográficos, onde conheceu Emmanuel Lubezki - com quem compartilharia, nos anos seguintes, uma colaboração extensa e muito prodigiosa. Foi nesse centro de estudos que desenvolveu um curta-metragem (seu terceiro até aquele momento) junto com Lubezki e Carlos Marcovich, chamado de "Vengeance is mine" que causaria seu banimento desse grupo de estudos por ter gerado discórdia ao produzir o curta-metragem totalmente em língua inglesa.
Sua formação incluiu, também, estudos de cinema e filosofia na prestigiada Universidade do México, onde aprimorou ainda mais suas habilidades técnicas e desenvolveu sua sensibilidade artística.
Após ser expulso, Cuarón trabalhou como assistente e diretor de projetos para a televisão. Além disso, os primeiros passos do diretor na indústria cinematográfica foram marcados por uma série de curtas-metragens e projetos independentes que chamaram a atenção por sua originalidade e estilo visual distintivo. Seu talento logo o levou a dirigir seu primeiro longa-metragem (que coescreveu com seu irmão Carlos Cuarón) "Sólo con tu pareja" (1991), uma comédia ousada que lhe rendeu reconhecimento nacional e internacional. O filme aborda temas como as inconsistências na construção dos conceitos de masculinidade, tema que ele abordaria novamente no futuro, me outro longa-metragem.
Esse sucesso, logo em sua estreia, chamou a atenção de produtores em Hollywood, o que levou com que Cuarón iniciasse uma carreira nos EUA trabalhando como diretor em alguns programas de televisão americanos; e continuou nesses passos até conseguir sua primeira oportunidade para dirigir um longa-metragem em língua estrangeira.
Sua estreia na língua inglesa aconteceu com "A princesinha" (1995) que, apesar de não ter sido um grande sucesso de bilheteria, conquistou a crítica e acabou ganhando duas indicações ao Oscar (uma delas sendo de Melhor Cenografia e Fotografia para seu amigo Emmanuel Lubezki, a primeira de muitas). A qualidade da produção agradou os produtores, o que ajudou na realização de seu filme seguinte, lançado em 1998, "Grandes esperanças" (baseado no clássico escrito por Charles Dickens). Este filme foi mais uma tentativa de Cuarón de conseguir sucesso nos cinemas americanos, mas as constantes tentativas dos produtores de impedir o diretor de trazer um tom mais sensual à narrativa aliadas ao pouco sucesso do filme nos cinemas fizeram com que esta experiência fosse frustrante. Com isso, ele percebeu que, talvez, devesse retornar às suas origens para se entregar a uma nova empreitada.
Foi então que ele produziu seu primeiro grande sucesso ao contar a história que se baseava em sua juventude e nas personalidades que marcaram esse período de sua vida. Além disso, desenvolveu uma narrativa em que o sexo (e o desejo) eram elementos essenciais para a narrativa. Foi com o lançamento de "E sua mãe também" (2001) que Alfonso Cuarón conquistou reconhecimento global. O filme, que retrata uma jornada emocional e sensorial pelas paisagens do México, recebeu aclamação da crítica e conquistou grande público ao redor do mundo. Sua habilidade em combinar uma narrativa poderosa com uma estética visual arrebatadora estabeleceu Cuarón como um diretor de destaque no cenário cinematográfico internacional, além de lhe garantir sua primeira indicação ao Oscar de Melhor Roteiro Original.
Este merecido sucesso fez com que seu trabalho fosse considerado para novas propostas (dentro e fora do México) de grandes estúdios. Uma dessas propostas, que acabou se concretizando, foi a de ser o diretor de uma das sequências de Harry Potter. Em 2004, Cuarón surpreendeu o mundo com "Harry Potter e o prisioneiro de Azkaban", o terceiro filme da série baseado nos livros de J. K. Rowlling. Sua abordagem inventiva e atmosférica trouxe uma nova profundidade à franquia, sendo amplamente elogiada pelos fãs e pela crítica. O filme solidificou sua reputação como cineasta capaz de combinar sucesso comercial com integridade artística, elevando ainda mais a qualidade de produção dos filmes da famosa série Harry Potter.
Sua produção seguinte também foi baseada em um livro. "Filhos da esperança" (2007) foi baseado no romance de P. D. James do mesmo nome e acompanha a história de Theo Faron que vive em 2007 numa realidade em que não nascem mais crianças no mundo há muitos anos, pois todas as mulheres se tornaram inférteis. Um milagre acontece ao mesmo tempo que uma grande tragédia, fazendo com que o protagonista se envolva numa jornada perigosa. Em uma produção grande e com uma narrativa surpreendente, o diretor conduz o público em uma história profunda por meio de diversos temas como imigração, guerra e caos social. Apesar da aclamação por parte da crítica, o filme não conseguiu uma bilheteria capaz de recuperar o alto orçamento da produção. Ainda assim, recebeu três indicações aos Oscares de Melhor Roteiro Adaptado, Melhor Edição e Melhor Cinematografia).
Apesar de ter alcançado o sucesso desejado nesta produção, foi somente sete anos depois que Cuarón conseguiu alcançar um dos pontos mais altos de sua carreira, com o excelente filme "Gravidade" (2013). Este épico espacial, estrelado por Sandra Bullock e Geroge Clooney, não apenas arrebatou o público com sua intensidade e imersão, como também recebeu uma aclamação da crítica nunca antes vista na carreira do diretor. Cuarón foi agraciado com o Oscar de Melhor Diretor, tornando-se o primeiro diretor latino-americano a receber este prêmio. O filme conquistou mais outros seis prêmios técnicos na premiação americana e uma indicação a Melhor Filme.
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Alfonso Cuarón dirigindo Sandra Bullock e George Clooney durante as gravações de "Gravidade" (2013). Fonte: site vulture.com. |
Desde então, Cuarón continua a desafiar as convenções do cinema, explorando novas formas de contar histórias e expandindo os limites da linguagem cinematográfica. Seu trabalho mais recente, "Roma" (2018), uma homenagem íntima à sua infância no México, recebeu inúmeros prêmios e consagrações, solidificando seu lugar como um dos diretores mais influentes da atualidade. Com essa produção, ganhou o Leão de Ouro (prêmio máximo no Festival de Veneza, o mais antigo grande festival de cinema do mundo) e seu segundo Oscar de Melhor Direção, além de ter levado os prêmios de Melhor Fotografia e Melhor Filme Internacional.
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Alfonso Cuarón dirigindo Yalitza Aparicio durante as gravações de "Roma" (2018). Fonte: Site hollywoodreporter.com. |
Alfonso Cuarón é mais do que um diretor de cinema: ele é um visionário, cuja paixão pela arte e compromisso com a excelência continuam a inspirar gerações de cineastas ao redor do mundo. Sua jornada desde as ruas da Cidade do México até o palco do Oscar é um testemunho de sua visão única e inabalável determinação em transformar sonhos em realidade na tela grande. Por isso, é importante manter a atenção em seus projetos futuros.
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