segunda-feira, 13 de maio de 2024

Cinema: a vida e a carreira de Glauber Rocha

Glauber Rocha, o cineasta brasileiro
Por Anthony M. D. Muniz

"O Cinema Novo esteve ao lado da utopia brasileira. Se é feio, irregular, sujo, confuso e caótico, é também belo, desarmônico, luminoso e revolucionário". Glauber Rocha

Glauber Rocha, um dos mais renomados diretores de cinema do Brasil é um dos principais representantes do movimento do Cinema Novo, deixou uma marca permanente na história da cinematografia brasileira. Sua vida e carreira são um testemunho de criatividade, engajamento político e uma busca incansável por uma identidade cinematográfica autenticamente brasileira.

Nascido em Vitória da Conquista, Bahia, em 14 de março de 1939, Glauber cresceu em um ambiente culturalmente rico e politicamente agitado. Mudou-se para Salvador com sua família em 1947 e, desde cedo, demonstrou interesse pelas artes e pelo cinema. Ainda em sua juventude conheceu o cineasta Luiz Paulino dos Santos e, assim, pode se envolver pela primeira vez na produção de um curta-metragem em "Um dia na rampa" (1955). Em 1959 iniciou seus estudos na Faculdade de Direito na hoje conhecida como Universidade Federal da Bahia (UFBA).

Glauber estreou como diretor em 1959, com os curtas-metragens "Pátio" e "Cruz no pátio" e essa experiência foi crucial para os rumos que sua vida tomaria desde então. Logo após, em 1961, ele abandonou o curso de Direito para trabalhar como crítico de cinema. Foi nesse momento que, se casou com a atriz Helena Ignez.

Seu primeiro longa-metragem, "Barravento" (1962) já demonstrava sua abordagem única e provocativa. Em seus filmes, Glauber buscava retratar a realidade brasileira de uma maneira não convencional, utilizando técnicas inovadoras e estilísticas que desafiavam as convenções cinematográficas da época.

Um dos filmes mais emblemáticos de Glauber é "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (964), uma obra-prima do Cinema Novo que explora temas como religião, violência e opressão social no nordeste brasileiro. O filme foi lançado no Festival de Cannes (concorrendo à Palma de Ouro) e recebeu aclamação internacional, solidificando a posição de Glauber como um dos diretores mais importantes do Brasil. Sua linguagem visual inovadora e seu estilo narrativo ousado influenciaram gerações de cineastas em todo o mundo.

Cena com o protagonista do filme "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964). Fonte: https://www.em.com.br/app/noticia/cultura/2022/05/03/interna_cultura,1363772/deus-e-o-diabo-na-terra-do-sol-sera-lancado-pela-segunda-vez-em-cannes.shtml

No entanto, apesar de seu talento e reconhecimento internacional, Glauber enfrentou desafios em sua carreira, incluindo a censura do regime militar brasileiro, que via suas obras como subversivas. Ele passou períodos no exílio, mas continuou a produzir filmes provocativos e visionários como "Terra em transe" (1967) entre outros. Este filme se passa em Eldorado, um país fictício da América Latina, e segue as vicissitudes de um intelectual idealista, Paulo Martins, que se envolve nas intrigas políticas e nas lutas de poder de sua nação. Glauber utiliza uma narrativa não linear e uma linguagem visual arrojada para retratar as complexidades políticas e sociais do contexto latino-americano. O filme é uma crítica contundente às elites corruptas, ao imperialismo estrangeiro e à manipulação da mídia, enquanto examina as contradições e compromissos morais enfrentados por aqueles que buscam mudança.

A cinematografia de "Terra em transe" é marcada por imagens icônicas e simbolismo poderoso, com destaque para os contrastes entre luz e sombra, os enquadramentos intrincados e a edição dinâmica. A trilha sonora, composta por Sérgio Ricardo, contribui para a atmosfera intensa e dramática do filme.

O título "Terra em transe" evoca um sentido de tumulto e instabilidade, refletindo não apenas as convulsões políticas do enredo, como também a condição turbulenta de toda uma região. O filme é uma reflexão profunda sobre os dilemas enfrentados por países em desenvolvimento, presos entre tradição e modernidade, nacionalismo e globalização, idealismo e pragmatismo.

Em "O dragão da maldade conta o santo guerreiro" (1969) ele apresenta uma sequência para os eventos de "Deus e o Diabo na Terra do Sol" (1964), em que Antônio das Mortes deve voltar à ação após matar o último dos cangaceiros há 29 anos, quando surge um novo bandido, que acabará por se revelar um idealista e o marcará profundamente. Esse filme é uma obra visualmente impressionante, com paisagens deslumbrantes do sertão nordestino e uma trilha sonora envolvente que combina música regional com elementos de vanguarda. O filme recebeu o prêmio de Melhor Diretor no Festival de Cannes em 1969, consagrando Glauber Rocha como um dos grandes cineastas do seu tempo e elevando o Cinema Novo brasileiro ao cenário internacional.

O diretor de cinema Glauber Rocha. Fonte: https://hojebahia.com.br/noticia
/2145/glauber-rocha-a-arte-nao-e-so-talento-e-sobretudo-coragem.html

Além de sua contribuição para o cinema, Glauber Rocha também foi um importante pensador e ativista político. Ele defendia uma visão de cinema como uma ferramenta de conscientização e transformação social, e suas obras frequentemente abordam questões de desigualdade, colonialismo e resistência, estando em total sintonia com o debate público sobre as efervescentes mudanças do país. Ele também acreditava no poder do cinema como uma forma de conscientização e transformação social, e sua militância política era evidente em seus filmes e em sua vida pessoal.

Apesar de sua vida ter sido interrompida precocemente com sua morte aos 42 anos em 1981, Glauber Rocha deixou um legado duradouro no cinema brasileiro e continua sendo uma figura inspiradora para cineastas e artistas em todo o mundo. Sua coragem em desafiar convenções, sua paixão pela arte e seu compromisso com a justiça social garantem que seu trabalho permaneça relevante e impactante até os dias de hoje. Seu nome permanece vivo como uma das figuras mais importantes e influentes da história do cinema brasileiro.


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